Amazônia queer ocupa o primeiro museu LGBTQIA+ da América Latina com mostra de artista do Pará
03/12/2025
(Foto: Reprodução) Obra da mostra "Tybyras", de Henrique Montagne
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A exposição “Tybyras: Caminhos de uma Amazônia Queer”, do artista paraense Henrique Montagne, ocupa o primeiro museu LGBTQIA+ da América Latina. Corpos caboclos, indígenas e periféricos protagonizam a mostra, que reúne fotografia, desenho e texto para registrar afetos que resistem na Amazônia paraense. A mostra fica em cartaz até 11 de janeiro de 2026 no Museu da Diversidade Sexual, em São Paulo.
Considerado um dos jovens artistas mais promissores do Norte do Brasil e destaque no Prêmio PIPA, Montagne parte da história de Tibira do Maranhão, indígena tupinambá executado em 1614, no que é reconhecido como o primeiro caso documentado de morte por LGBTfobia no Brasil. A partir dessa violência histórica, Montagne constrói uma ponte entre passado e presente, aproximando a trajetória de Tibira de pessoas LGBTQIA+ que hoje vivem na Amazônia paraense.
Agatha Felina, artista do Marajó, é uma das criadoras do Rainha das Matas, evento queer ribeirinho
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“Vir da periferia, concluir meus estudos em artes e dedicar minha vida a isso, trazendo um trabalho consistente que traz uma vivência afetiva e ancestral pelo território amazônico e LGBTQIA+ do Pará para o outro lado do país, tem um peso simbólico de vitória e conquista enormes, muito, devido ao histórico do sistema da arte “brasileiro” apenas relacionar-se repetidamente com o eixo Rio-São Paulo. Mas o que fazemos aqui também é arte brasileira”, diz o artista. “Trazer essa história para o Museu da Diversidade Sexual é afirmar que a Amazônia também produz pensamento, arte e política queer.”
Para erguer a exposição, Montagne percorreu territórios amazônicos como Mairi (nome de Belém antes da colonização), Ilha do Marajó, Carajás e Tapajós, reunindo histórias de pessoas LGBTQIA+ indígenas, ribeirinhas, mestiças e caboclas. Dessas vivências surgiu um aldeamento simbólico de afetos, memórias e identidades, um espaço de cura frente aos apagamentos coloniais.
“É muito importante trazer esses debates, expandindo diálogos sobre sexualidade, gênero, biologia, clima e história colonial, sempre conectando à resistência na Amazônia”, afirma.
Henrique apresenta seu trabalho no Museu da Diversidade Sexual
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Retomada
“Tybyras” marca também um momento de retomada da circulação institucional das obras de Montagne. Em 2021, uma exposição sua com temática homoafetiva, já selecionada por edital público, foi cancelada pelo patrocinador, sem justificativa formal, na véspera da abertura.
A decisão teve ampla repercussão na imprensa e no meio cultural, sendo tratada, à época, como parte de um debate maior sobre pressões morais e censura envolvendo obras com temática LGBTQIA+. O episódio interrompeu um ciclo de crescimento profissional do artista, mas não o desmobilizou.
A exposição em São Paulo faz parte de sua circulação nacional com apoio do Programa Nacional Aldir Blanc (PNAB) e consolida uma trajetória que transita entre o Brasil, Portugal, Estados Unidos e Grécia, em torno de uma mesma pergunta: o que resiste quando tentam apagar?
“Depois de ser barrado, decidi seguir criando a partir da Amazônia, com independência. Levar ‘Tybyras’ a São Paulo é descentralizar o olhar sobre o que se faz no Norte e reafirmar que nossa produção também pensa o contemporâneo. Estar no Museu da Diversidade Sexual é um gesto político e afetivo: meu trabalho nasce da resistência, e o museu também”, diz Montagne.
A chegada da exposição ao MDS, centro de referência latino-americana na preservação de narrativas queer, reforça a presença da Amazônia no debate artístico internacional.
“Ao trazer o trabalho de um artista jovem da Amazônia, reafirmamos o museu como lugar de resistência e visibilidade. A obra de Henrique amplia o entendimento sobre diversidade e meio ambiente. Ela mostra que a Amazônia também é queer, viva e múltipla”, afirma Beatriz Oliveira, gerente do MDS.
Serviço
Exposição: “Tybyras: Caminhos de uma Amazônia Queer”
Local: Museu da Diversidade Sexual – Praça da República, 299, São Paulo
Em cartaz até: 11 de janeiro de 2026
Horário: terça a domingo, das 10h às 18h
Entrada: gratuita
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